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quinta-feira, 14 de março de 2013

HIE: EDUCAÇÃO GREGA - Platão (Edson Lopes)

 
 
Platão é um personagem a ser destacado quando se discute a contribuição grega para a educação. Ele viveu nos anos 427 a 347 a.C. Era descendente de uma família ateniense nobre. Do lado paterno, contava com Codros, um dos mais antigos reis de Atenas, e, pelo lado materno, com o famoso estadista grego Sólon. Seu nome era Aristócles, mas ficou conhecido pelo seu apelido de Platão, que compreende as especulações: por ter os ombros largos; por ter a testa avantajada ou por causa da profundidade do seu pensamento.¹

Seu encontro com Sócrates² foi aos vinte anos de idade por intermédio dos seus parentes Crítias e Cârmides, amigo do citado filósofo. De Sócrates, Platão chegou a afirmar³: "o melhor homem entre todos que conhecemos, o mais sábio e o mais íntegro".

Nos doze anos seguintes após a morte de Sócrates, dedicou-se à produção literária e a viagens esporádicas à Grécia ocidental; dali, esteve em Taras, Mégara, Egito, Cirene⁴. Ao retornar a Atenas, Platão, após ampliar seus horizontes culturais e amadurecer suas reflexões filosóficas, resultado de suas viagens, resolveu fundar sua própria escola, denominada Academia, a qual se tornaria protótipo dos colégios e universidades futuros⁵.
 
A tônica da Academia era a preparação do indivíduo na política; buscava ser um colégio filosófico para formar um novo tipo de dirigentes para o mundo grego, que se tornaram especialmente procurados como conselheiros para a elaboração de constituições ou de projetos de nova legislação⁶. A academia se tornou o centro formador de alunos que contribuíram para a vida política de diferentes localidades do mundo grego. Platão dedicou-se totalmente ao desenvolvimento da Academia e a escrever numerosos diálogos maiores, incluindo A república, sua obra magna.
 
Percebemos que a Academia buscava formar futuros líderes; entretanto, não se tratava de um centro formador voltado apenas para a política. Platão demonstra sensível preocupação com a alma. Aí estava seu diferencial em relação aos sofistas.
 
Trata-se de uma concepção educacional oposta à dos sofistas, por considerá-los pragmáticos e por buscarem o conhecimento utilitário a serviço dos discursos políticos. Sua oposição ficou clara quando buscou construir seus pressupostos filosóficos da educação sob a noção fundamental da verdade, a qual, segundo os sofistas, era relativa; mas, conforme Sócrates e Platão, real e absoluta⁷. Além disso, a educação concebida por Platão, com vistas à formação do dirigente político, é um tipo de educação dotada de valor e alcance universais. Qualquer que seja o campo da atividade humana para o qual alguém se oriente, não há mais do que uma cultura válida: a que aspira à verdade⁸. Para Platão, a busca da verdade é o fundamento da vida humana, e é por assim pensar que ele ressalta uma educação que prioriza o cuidado com a alma, haja vista que somente ela pode alcançar o mundo das ideias, onde se encontra a verdade.

Percebemos que esse foco educacional de Platão está diretamente relacionado com a educação cristã, uma vez que esta também prioriza o cuidado com a alma. É notório entre os cristãos que há uma preocupação com o corpo; todavia, os assuntos relativos à alma ainda são prioridade na relação do homem com o Criador, o que demonstra a influência de Platão na teologia ocidental da Antiguidade até os dias de hoje⁹.
 



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¹ ANTISERI, História da filosofia, p. 125.
² Para saber mais sobre a vida e a obra literária de Platão, cf. Edson Pereira Lopes. O Cuidado com a alma imortal nos diálogos Fédon, Fedro e República de Plantão. In: Revista Estudos de Religião. São Bernardo do Campo: Metodista, nº 35, dez. de 2008, p. 178-194.
³ Apologia de Sócrates, p. 190.
⁴ Edson Pereira Lopes, A história da educação no período dos primeiros pais da Igreja, p. 180.
⁵ Idem, p. 179.
⁶ Idem, p. 181. 
⁷ Idem, p. 193.
⁸ H. I. MARROU, História da educação na Antiguidade, p. 111.
⁹ Para saber mais sobre o assunto cf.Edson Pereira LOPES. A história da educação no período dos primeiros pais da Igreja, p. 178-194.



quinta-feira, 7 de março de 2013

HIE: EDUCAÇÃO GREGA - Sócrates (Edson Lopes)


SÓCRATES nasceu em 470-399 a.C., período em que os gregos puseram fim à hegemonia dos persas no Mediterrâneo; era de uma família ateniense urbana e de posses modestas¹. Sua mãe, Fenarete, foi parteira; seu pai, Sofronisco, foi escultor, e essa também foi sua profissão, apesar de pouco se dedicar a ela.

Platão caracteriza Sócrates, ao compará-lo com os sátiros e silenos, como calvo, fisicamente feio, com nariz achatado, o olhar penetrante de um fauno; era dotado de corpo musculoso, mas sem elegância. Sempre descalço e vestido com um manto grosseiro no inverno e no verão, perambulava pelas ruas de Atenas cercado de amigos e companheiros² e procurava conversar com homens de todas as classes sociais. Aparecia nas oficinas e na lojas, nos ginásios e nos balneários, comparecia a festas e a jantares, sempre provocando discussões veementes, mas sem nunca perder a calma e atitude nobre e modesta. Pretendia despertar nos ouvintes o interesse pelas coisas do espírito. Nas discussões, baseava-se em argumentos simples e convincentes, extraídos da realidade da vida cotidiana, encaminhando a conversa de pergunta em pergunta, sempre à procura da verdade e das definições mais precisas.

Querofonte, amigo de infância de Sócrates e companheiro do povo, perguntou ao oráculo de Delfos, Pítia, se existia alguém mais sábio que Sócrates, e o oráculo respondeu: "O mais sábio dentre vós, homens, é quem, como Sócrates, compreendeu que sua sabedoria é verdadeiramente desprovida do mínimo valor"³.

Sócrates se propôs a investigar as razões de tais palavras e descobriu que o oráculo o tinha por sábio, pois nenhum valor há na sabedoria humana. A partir daí, ele se apresentava como um homem que reconhecia sua própria ignorância, o que resultou na sentença a ele atribuída: "Eu [só] sei que nada sei".

Como consequência de sua maneira de viver do reconhecimento da própria ignorância, no início de suas atividades filosóficas poucos jovens foram atraídos por ele. Ele buscava a companhia de jovens nos ginásios, onde se reuniam para a prática de exercícios atléticos, e conversava com alguns deles enquanto descansavam após os exercícios.

Os ginásios atléticos eram as escolas e as faculdades da época, onde os futuros líderes da sociedade podiam ser encontrados e influenciados. Sócrates imaginava que poderia prestar melhor serviço aos interesses de Atenas, ao propiciar àqueles jovens aristocratas pensar na que considerava a mais importante de todas as questões: Como um homem pode conduzir sua vida?⁴

Homens mais idosos também se juntavam a essas discussões, e muitos, que se julgavam bons conselheiros e juízes prudentes de questões duvidosas viam suas pressuposições seriamente postas à prova e às vezes refutadas pela dialética socrática. Muitos idosos sentiam que haviam sido humilhados diante dos mais jovens, e o resultado era o acúmulo de suspeitas e antipatias contra Sócrates.

Entretanto, ao mesmo tempo que os mais idosos eram antipáticos a Sócrates, muitos jovens de famílias ricas uniram-se a ele, a partir de um pequeno grupo de discípulos que admirava seu espírito de coragem e achava sua conversa estimulante e instrutiva⁵.

Ele não pretendia apresentar quaisquer doutrinas especiais para serem transmitidas; antes, postulou uma atitude nova e crítica na vida. A maneira de filosofar de Sócrates era a de uma confrontação intelectual e moral, uma exortação constante a que as pessoas se preocupassem com a verdade e com o bem-estar da alma. Seu método era o da conversação, e seu primeiro objetivo era a refutação do erro. Depois disso, ele podia trabalhar no sentido de instilar um senso verdadeiro de valores no ouvinte. O primeiro passo rotineiro na conversa era: "Examinemos, juntos, o problema".

O resultado de suas ideias foi sua condenação e morte pelas oligarquias atenienses, uma vez que tais homens sentiram-se ameaçados por seus ensinos. Uma sentença atribuída a Sócrates, "Conhece-te a ti mesmo", mas cujo inventor foi Pítaco, demonstra seus princípios educacionais.

O conhecimento era uma das principais discussões nos dias de Sócrates e tornou-se uma de suas marcas distintivas em relação aos sofistas. Em sua compreensão, a virtude (areté) não poderia ser objeto de uma arte especial, ou que pudesse ser dominada; pelo contrário, o bem é uma virtude de toda alma. O bem, ao qual todos os homens aspiram, não deve ser entendido apenas num sentido moral, mas como aquilo que é digno das aspirações do homem, incluindo o que é útil.

As aspirações por alcançar a virtude se tornam, assim, o esforço por alcançar um saber perfeito, cujo núcleo está na alma humana; nesta, o verdadeiro conhecimento está presente, pois "o conhecimento perfeito só pode ser encontrado num ser que não tem tempo e é imutável, não conhece nem origem nem morte"⁶.

Daí a sentença de Pítaco "Conhece-te a ti mesmo" ser relevante para o método socrático da maiêutica. Para Sócrates, o conhecimento seguro deveria partir da alma, do interior para o exterior. Por conseguinte, o homem só poderia encontrar o conhecimento verdadeiro por meio do zelo de sua alma. Para isso, havia necessidade de se despir da arrogância. Essa preocupação deu origem ao método denominado ironia, o qual consistia em perguntas dirigidas ao seu interlocutor. Elas eram tantas que, no decorrer do diálogo, o interlocutor entrava em contradição com suas afirmações, de tal forma que admitia não conhecer todas as coisas.

O objetivo de Sócrates era derrubar toda pretensão ou presunção do saber. Buscava-se purificar o caráter, à medida que conduzia seus interlocutores à confissão de suas próprias contradições e ignorância, onde antes só julgavam possuir certezas e convicções. Uma vez inserido no diálogo, a intenção real de Sócrates era despertar no discípulo o desejo de procurar as próprias respostas por si mesmo, iniciando suas próprias reflexões; era nesse momento que a maiêutica ocorria.

Portanto, a educação socrática possui caráter ativo e deve prover condições para a reflexão a partir de si mesmo, isto é, o saber de "dentro de fora", e o conteúdo das discussões educacionais deve ser extraído do cotidiano.




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¹ J. BRUN, Sócrates, Platão e Aristóteles, p. 27.
² Diálogos. In: O banquete, p. 8.
³ PLATÃO,  Apologia de Sócrates, p. 44, 47.
J. V. LUCE, Curso de filosofia grega do século VI a.C., p. 89.
PLATÃO, Apologia de Sócrates, p. 47.
⁶ W. BURKERT,  Religião grega na época clássica e arcaica, p. 610-611.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Perspectivas na Abordagem da Educação Cristã - Edson Lopes



O ESTUDIOSO MARROU¹, EM SUAS REFLEXÕES sobre a história da educação na Antiguidade, demonstra que, desde as mais tenras sociedades, como mesopotâmica, chinesa, grega, dentre outras, as discussões educacionais têm sido um tema relevante, não sendo de admirar que muitos grandes filósofos e pensadores da História lhe tenham dedicado tempo e atenção².  Uma das razões para que isso ocorra é a crença de que a educação é um trunfo indispensável à humanidade, para o crescimento e desenvolvimento dos diversos países e construção dos "ideais da paz, da liberdade e da justiça social"³.

Apesar das palavras anteriores, na prática poucos demonstram a vital importância dela. Percebemos essa situação quando nos deparamos com a matriz curricular de alguns cursos de teologia das igrejas evangélicas. Alguns já não contemplam, como disciplina obrigatória, a educação cristã, que é imprescindível à formação pastoral, inclusive por tratar de assuntos relativos à educação de seus próprios filhos, dos filhos de seus fieis, da igreja e da sociedade local em que a igreja está inserida. 

Uma das razões para isso é que, à semelhança do que acontece com a educação em geral, há uma crença comum de que qualquer pessoa pode trabalhar com educação cristã. Devemos nos lembrar, quando assim agimos, do exemplo de João Calvino, que teria todas  as condições para ser o reitor da Academia que fundara; entretanto, delegou a Theodoro Beza a responsabilidade de fazer dela uma escola que viesse a servir a Deus, aos propósitos da Reforma Protestante e à sociedade de sua época. Em seu entendimento, Beza era mais capacitado para o exercício dessa função.

Se partirmos do princípio de que todos compreendem a educação cristã, não é necessário discuti-la e aperfeiçoa-la. Talvez seja essa uma das razões pelas quais nós, cristãos, pouco destacamos a educação cristã como instrumento de aperfeiçoamento e crescimento de nossas igrejas. O resultado é que são raríssimos os encontros e debates aprofundados, com a preocupação de prover, por exemplo, uma metodologia de ensino mais adequada às diversas comunidades cristãs brasileiras, o que leva ao decréscimo da participação de muitos nos estudos bíblicos semanais e na escola dominical.

Se isso tem ocorrido no interior da igreja local, pouco há para discutir acerca da participação cristã na sociedade. Novamente, retomamos o assunto a partir da Reforma Protestante. No estudo da Reforma, percebemos claramente que havia preocupação com as questões espirituais, mas também a preocupação de colaborar com as diversas facetas da sociedade.  Foi na Reforma que a educação, de fato, tornou-se pública. Lutero e Calvino, dentre outros reformadores, procuraram fundar escolas sustentadas pelo Estado e que propiciassem qualidade de ensino. Foi com essa perspectiva que os protestantes, no final do século XIX, fundaram escolas ao lado de suas igrejas.

Isso significa que a Igreja evangélica não pode entender que a educação cristã limite-se a te ligação estreita e direta tão somente com a escola dominical; essa, inclusive, parece ser a razão pela qual a maior parte da literatura sobre educação cristã é relacionada com a escola dominical⁴; a despeito de se tratar de textos relevantes, são perfeitamente indicados aos interessados nos estudos restritos à escola dominical.

É desnecessário enfatizar que a escola dominical tem sido o principal agente da educação nas mais diversas comunidades cristãs. Dada sua importância, é preciso que ela seja foco de investimentos estruturais e físicos. Além disso, as aulas e o material de apoio do processo ensino-aprendizado devem ser compatíveis com a maturidade intelectiva dos alunos, e deve-se estimular o aperfeiçoamento intelectual, pedagógico e espiritual do corpo de oficiais e professores e dos respectivos alunos.

Entretanto, a visão da educação cristã como restrita à escola dominical permitiu a Moran⁵ sustentar que, no cristianismo protestante, a "educação cristã" em geral é vista como a atividade pela qual os "ministros de uma igreja doutrinam as crianças para obedecerem a uma igreja local". Há certo exagero nas palavras de Moran, mas aí está algo sobre o que as comunidades cristãs deveriam refletir, uma vez que isso pode, em parte, explicar a práxis de muitos educadores cristãos que se voltam somente para o que acontece em suas respectivas comunidades religiosas.

É mister destacar que a educação cristã envolve muito mais do que conteúdos de aulas ou sermões. Ela está diretamente relacionada ao crescimento espiritual da igreja e ao ensino bíblico e missionário. Também está presente em aconselhamentos e orientações cristãs e é imprescindível nas relações igreja-sociedade.

Entendida dessa forma, há que se ressaltar quão importante é a educação cristã para a vida da igreja.



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¹ História da educação na Antiguidade, p. 4-14.
² T. H. GROOME, Educação religiosa cristã: compartilhando nosso caso e visão,p. 21.
³ L. A. CUNHA, Educação e desenvolvimento social no Brasil, p. 16. 
⁴ L. DORNAS, Socorro! Sou professor da escola dominical, p. 141-148.
⁵ Religious Body, p. 150.